Com muita
improvisação, muito voluntarismo e pouco planejamento, a cúpula do governo
federal tem cortado impostos e contribuições de maneira estabanada, sem calcular
com o necessário cuidado as consequências - boas e más - dessas medidas. O
descontentamento de funcionários da Receita Federal, revelado em reportagem do
Estado, confirma essa avaliação, já publicada em mais de uma análise
jornalística.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, nega qualquer
enfraquecimento da Receita Federal. Segundo ele, o pessoal do setor tem
realizado os cálculos de todas as desonerações. Fontes do Ministério da Fazenda
atribuem as queixas ao corporativismo. Medidas tributárias, acrescentam, fazem
parte da política econômica e seria incorreto atribuir ao Fisco a palavra final
sobre o assunto. Com essas considerações, reconhecem a existência das críticas,
formuladas, por motivos facilmente compreensíveis, de forma anônima. Definir a
política econômica é de fato atribuição dos escalões superiores do governo, mas
a Receita, é preciso lembrar, é responsável pela arrecadação esperada por
aquelas mesmas autoridades.
Além disso, é o órgão mais equipado para avaliar o
efeito fiscal de cada aumento ou redução de tributo. Nem todos os cálculos têm
sido baseados nas melhores informações, porque a liberação dos dados toma algum
tempo. "As medidas são para ontem", disse um técnico citado na reportagem. Com a
pressa, as estimativas são às vezes baseadas em dados do próprio setor
beneficiado pela desoneração, de acordo com a mesma fonte. Além disso, decisões
de efeito permanente são tomadas com base apenas em avaliações de curto prazo,
sem estimativas mais detalhadas de seus efeitos em período mais longo. É o caso
da desoneração das folhas de pagamento de vários setores.
Nenhuma dessas
críticas surpreende quem acompanha a política econômica nas várias frentes. A
política de redução de juros foi obviamente urdida no Palácio do Planalto e
aplicada pelo Banco Central (BC). Há pouco tempo a presidente Dilma Rousseff
ainda se pronunciou contra o combate à inflação por meio do aperto monetário. A
orientação só foi alterada, pouco depois, porque a inflação já havia estourado o
limite da margem de tolerância, era reconhecida como persistente e preocupante
pelo presidente do BC e era urgente restabelecer a imagem da autoridade
monetária. Até a presidente deve ter percebido o custo de um comprometimento
maior dessa imagem. O mesmo voluntarismo e a mesma visão de curtíssimo prazo têm
prevalecido em outras ações de controle da inflação - ou, mais precisamente, de
controle temporário dos indicadores de alta de preços.
A desoneração da cesta
básica, a redução das contas de eletricidade e a contenção das tarifas de
transporte coletivo foram decididas com esse objetivo. Nenhuma dessas medidas é
parte do arsenal da política anti-inflacionária e também isso ressalta o
amadorismo da política elaborada nos escalões mais altos do governos. Mas todas
essas providências têm um custo fiscal, pela redução da receita ou pelo aumento
de subsídios.
Com a insistência na improvisação e nas ações ditadas por
preocupações eleitorais, o governo conseguiu converter em erros graves decisões
que seriam muito bem-vindas em outras circunstâncias. Essas medidas podem ter
ocasionado benefícios temporários a alguns segmentos da indústria, mas foram
insuficientes para garantir um crescimento econômico superior a 0,9% no ano
passado. Além disso, até a administração federal tem reduzido as previsões de
expansão do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano. Mas ninguém projeta uma
inflação próxima da meta em 2013.
Com escasso benefício para a economia, mesmo a
curto prazo, a bagunça tributária promovida pelo governo poderá revelar-se uma
poderosa bomba de efeito retardado, especialmente se as condições da economia se
agravarem, advertem funcionários da Receita Federal. Mas o aviso dificilmente
será ouvido por um governo empenhado em vencer as eleições de 2014 mesmo a um
preço desastroso.
Fonte: O Estadão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário